Friday, October 28, 2005

Ainda falando de seriado de TV


Eu acabei me associando ao Netflix pouco depois de chegar por aqui. Pago US$ 15.00 por mês e posso ter até dois filmes em casa por vez. O interessante é que recebo recomendações de acordo com a nota que dou a cada filme que assisto. Não sou muito fã de cinema de arte, confesso que acho maioria muito chato, mas adoro filme esquisito do tipo Donnie Darko. Também adoro séries legais de TV como já falei anteriormente.

Graças a estas recomendações aluguei Freaks and Geeks (algo como Galera da Geral e CDFs), uma série que foi bem vista pela crítica, foi indicada a vários prêmios, tem ainda hoje um fã-clube como o do arquivo X, mas que não foi um grande sucesso comercial e por isso só teve uma temporada. Minha esposa e eu assistimos este seriado feito loucos, todos os 18 episódios disponíveis em cerca de um mês. Neste seriado, não vemos os tipos artificiais e glamorosos de outros seriados do gênero. O interessante desta série são as pessoas realmente normais, tais como encontramos durante o colégio. Gente de carne e osso e insegurança de adolescente.


A trama inclui claro, os Freaks e os Geeks:

Geeks
Sam Weir – é o nosso herói. O mais popular dos geeks e o líder. É apaixonado pela Cindy Sanders, uma cheerleader que é um doce de menina. Cindy, é claro, prefere um atleta.

Lindsay Weir – irmã do Sam. É uma geek que é aceita pelos freaks. Acaba namorando o freak Nick, que se mostra o maior grudador. A intenção dela era namorar o Daniel, o freak garanhão.

Os outros Geeks: Neal Schweiber, o engraçadíssimo judeu que um dia deixará de ser Geek e Bill Haverchuck, um quase gigante, completamente desengonçado.

Freaks
Daniel Desario – é o líder dos freaks. Tem um jeito especial para as mulheres e ganha a atenção da Lindsay e da Kim, a namora encrenqueira.

Kim Kelly – uma moça à beira de um ataque de nervo. É a amiga pesadelo da Lindsay e namorada do Daniel: eles se entendem.

Os outros Freaks: Nick, grudento com as mulheres, inseguro, maconheiro e péssimo baterista e Ken Miller, um cínico, com excelente timing para humor.

. . .

E o impagável Sr. Rosso, um ex-hippie que agora é conselheiro escolar.

Para mais sobre a série:
http://www.freaksandgeeks.com

Deadwood e São Paulo



A grande sensação do momento na TV por aqui é Desperate Housewives que é a mistura de comédia (humor-negro) com drama. Eu pessoalmente sou fã de carteirinha do The Sopranos da HBO que vai voltar em nova temporada e fiquei fascinado com o Deadwood também da HBO.

The Sopranos: O personagem Tony Soprano, o chefão de New Jersey é uma lição de liderança melhor do que The Apprentice. O personagem não é em momento algum caricato e com certeza é possível identificá-lo com várias personalidades de nossa tão querida sociedade, mesmo que para isso seja preciso subtrair o fator ilícito, ou seja, neste caso se trata mais de liderança e poder do que do crime. Ele poderia ser um político, um advogado, um executivo poderoso, qualquer coisa nesta linha de poder e liderança.

O seriado Deadwood fala da cidade homônima na região da hoje Dakota do Sul no período anterior à anexação aos Estados Unidos da América. A cidade que possuía um grande filão de ouro atraiu o tipo errado de imigrante, a verdadeira escória, em contraposto ao típico imigrante do Mayflower que veio ao país fugindo da perseguição religiosa da rainha Elizabeth e assim criou um Estado baseado na ideologia da liberdade religiosa e de pensamento. Neste intuito tais imigrantes escreveram um contrato social ainda durante a viagem que funcionou como lei. Ao contrário do contrato social da França ou de outros países, este foi escrito do zero, para uma sociedade inexistente, sem privilêgios.

Deadwood atraiu o mesmo tipo de aventureiro que o Eldorado brasileiro atraiu, a mesma qualidade de escória. E neste ponto é que o seriado é interessante, mais interessante ainda porque eu estava lendo São Paulo: 100 anos de solidão, de Roberto Pompeu de Toledo, que traça um retrato de como uma cidade que tinha tudo para dar errado, acabou dando mais certo que o resto do país. Tanto em Deadwood (que existiu realmente) quanto na história de São Paulo, inicialmente houve o povoamento pela escória, mas depois passou a atrair a lei e as pessoas de bem.

A série se passa neste momento de transição em que a cidade começa a se preocupar em estabelecer a lei para anexar-se aos Estados Unidos. E este choque leva o coronel do local, dono do único bar e prostíbulo, Swearengen, a tanto odiar quanto precisar da nova ordem que se estabelece. Se fosse nos dias de hoje, Swearengen seria considerado um milionário pelo que possuia. A lei vem através do Bullock, um homem de bem. Deadwood era um território indígena demarcado pelos EUA, como São Paulo também era, com a proteção do Anchieta, que como Bullock, trouxe a civilização para a cidade e embora os dois fossem homens íntegros fizeram concessões para o bem da paz.

E agora chegamos finalmente ao ponto que eu queria: será que não seria possível algum programa de TV do Brasil tratar de tal assunto? Seria importante entender um pouco mais sobre nós brasileiros.

Thursday, October 20, 2005

Em algum momento os gostos mudam

Uma das leis de Murphy diz o seguinte: “se os fatos não corroboram a sua teoria, ignore os fatos”. Embora esta seja uma das piadas do anedotário das leis de Murphy muitas pessoas gostam de seguir fazendo as coisas deste modo.

Nietzsche diz que a nossa vaidade nos leva a crer que o que fazemos de melhor é o que há de mais importante. Nas organizações as coisas seguem muitas vezes desta maneira, quando um ponto em que somos bons (produto ou serviço) não é mais interessante para o mercado e este fato está claro para todos que estão do lado de fora e poderia ser verificado facilmente por uma pesquisa de mercado, às vezes, mesmo com esta pesquisa, as empresas continuam acreditando que o problema é do mercado e quando "o marcado" perceber que besteira está fazendo retornará a consumir na mesma proporção de antes.

Nos agarramos as nossas idéias como se estivéssemos nos desnaturando se aceitássemos o fato de que mesmo excelente como for, nosso produto não é mais aceito no mercado.

Para quem acha que conhece a si mesmo



“Nós, homens do conhecimento, não nos conhecemos; de nós mesmos somos desconhecidos – e não sem motivo. Nunca nos procuramos: como poderia acontecer que um dia nos encontrássemos? Com razão alguém disse: “onde estiver teu tesouro, estará também teu coração ”.”
Friedrich Nietzschie – Genealogia da Moral – Uma Polêmica (Prólogo)

“Penso, logo sou”.
Renée Descartes

“Penso onde não sou, portanto sou onde não me penso”.
Jacques Lacan (criticando Descartes e estabelecendo que o nosso eu está longe do nosso pensamento consciente)

“A existência precede a essência” .
Jean Paul Sartre

“A experiência [sintoma psicanalítico] tem (..) uma face perceptível pelos sentidos, que se apresenta como o instante em que o paciente diz e não sabe o que diz. É o momento do balbucio, ali onde o paciente gagueja, o instante em que ele hesita e sua fala se subtrai. (…) Sim, o inconsciente é, na verdade, a ordem de um saber que o sujeito veicula, mas ignora”.
J.D. Nasio – Cinco Lições sobre a Teoria de Jacques Lacan

“A razão é a inimiga que nos proíbe de experimentar novas formas de prazer”
Freud

“(…) Para Freud, a linguagem, longe de ser o lugar transparente da verdade, é o lugar do ocultamento. O sentido que se percebe oculta um outro sentido mais importante, e essa importância será tanto maior quanto maior for a articulação entre a linguagem e o desejo. (…) A função [da psicanálise] é fazer aparecer o desejo que o discurso oculta (…)”
Garcia-Roza – Freud e o inconsciente

Sunday, October 09, 2005

Max Weber não é atemporal


No início do século XX, o sociólogo alemão Max Weber lançou a obra “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo”. Os alemães, embora expostos somente nos últimos séculos à filosofia ocidental (antes eram considerados povos bárbaros), deram-lhe uma contribuição sem igual, destituindo-lhe a metafísica e aproximando-a da ciência.

A importância da obra de Weber é tão grande que se acredita ainda não obsoleta e sua objetividade supera em muito a de Karl Marx, que se deixou infectar pela ideologia. Max Weber nos apresenta esta obra-prima da sociologia sob a forma de trabalho científico. Já na problematização, primeira parte, em que ele apresenta sua hipótese, como Freud em seus manuscritos, mas de maneira menos explicita, lança mão do artifício de um interlocutor crítico. A hipótese é de que as regiões que sofreram forte influência protestante, hoje, ou pelo menos à época do livro, mostram-se mais economicamente desenvolvidas, ou melhor, mais capitalistas, devido a uma nova ética estabelecida pela influência religiosa. O fenômeno também é notado pelo maior número de profissionais de alto nível entre os de filiação religiosa protestante. O interlocutor crítico, então, lança uma possível nova leitura para tal fenômeno, a de que as regiões mais prosperas foram as que aderiram primeiro ao Calvinismo, Pietismo e Protestanismo e como pressupõe-se que a herança é também responsável pela transferência dos meios de produção e pelo custeio da cara educação necessária para a criação de mão-de-obra altamente especializada, esta seria uma explicação. Entretanto, no desenvolvimento do trabalho vemos que o interlocutor estava errado.

O que Weber quer demonstrar, e o faz de maneira competente, é que com os movimentos de Reforma religiosa destituíram-se os velhos dogmas católicos que viam no capitalismo, tal como o conhecemos, um pecado, ou mais especificamente, de que o dinheiro jamais pode ser um fim em si, mas um meio. A idéia de vocação, primeiro instituída na tradução para o alemão da Bíblia, cria uma nova ética, de que o trabalho é uma vocação. O capitalismo, até então, era exercido sem esta ética, de forma inconstante. As pessoas preocupavam-se mais com o suficiente para viver com certo conforto, qualquer desejo além disso era visto como usura, um pecado.

Ao expor frases de Benjamim Franklin como expoente desta nova ética, contendo afirmações como “lembra-te que o dinheiro é de natureza prolífica, procriativa” ou “lembra-te de que tempo é dinheiro”, Weber delimita o que ele considera o espírito capitalista no seu trabalho. As frases mostram que o capitalismo é o que a religião considerava usura. Surge então a indagação: como o que era pecado, apenas tolerado na antigüidade, torna-se virtude aceita por todos? A resposta vem da evolução da religião protestante que como já dito adiciona a palavra vocação ao vocabulário das pessoas. O trabalho passa a ser visto como uma obrigação para com Deus, uma vocação. O dinheiro proveniente dele, um bem divino, do qual o beneficiário não é o dono, mas somente o fiel depositário. Vê-se aí a natureza de poupança, tão importante para o capitalismo. A forma de se comportar também é importante, o trabalho é uma vocação, o dinheiro uma dádiva, mas a ostentação continua pecado. Weber, embora de maneira disfarçada, mostra um pouco da hipocrisia religiosa, pelo menos sob a luz de Franklin, que inclui normas de comportamento em suas frases, que se referem mais às aparências do que à ética.

O mais importante, entretanto, é que Weber reconhece o desligamento da religião com o capitalismo e apenas enxerga fortes traços da ética estabelecida pelas religiões de linha protestante com a ética capitalista moderna. O filósofo holandês de origem judaica, Spinozza, afirmou que deveríamos ver as coisas sob a perspectiva da eternidade. Este livro de Weber foi apontado como o mais lido do século, mas resta perguntar o quão atual ele é. Segundo o economista Claudio de Moura Castro, em seu ponto de vista publicado na revista Veja de 16 de junho de 1999, com o título “Como foi que deu Certo?”, falta surgir um Max Weber caboclo para explicar o aumento de 340 vezes do produto bruto brasileiro nos últimos 67 anos, uma vez que não somos muito partidários das virtudes protestantes (“trabalho duro, vida espartana, poupança e honestidade pessoal”). Max Weber não explica o Brasil.

Saturday, October 01, 2005

Papel Moeda (Papel Fiduciário – Fiat Money)


No século passado, a economia deu um grande salto e os problemas que implodiam economias foram melhor entendidos. Este negócio de riqueza em forma de papel pode parecer natural agora, mas não foi algo simples de ser implantado. Os negociantes de veneza são tidos como os inventores do papel-moeda, mas o verdadeiro inventor do papel-moeda como instrumento fiduciário (baseado na confiança) foi o escocês John Law. No século XVIII, este escocês fugitivo da forca na Inglaterra (matou um homem em um duelo em uma disputa por mulher) foi retirado pelos amigos da prisão e enviado para a Holanda. Na Europa, posava de cavalheiro em desgraça, com passado escandaloso. Se sustentava nas mesas de jogos. Era um grande estatístico numa época em que não se sabia o que era isto e utilizava estes conhecimentos para ganhar nas mesas de jogos como se fosse sorte. Também era bem apessoado e tinha a fama de mulherengo.

Na França, John Law conheceu Lady Catherine Seigneur, de família muito influente e já casada. Eles se apaixonaram, fugiram para a Itália e casaram-se. Pouco depois iniciou uma crise econômica na Escócia e John Law voltou ao seu país (ele era procurado na Inglaterra apenas) e convencido de que sabia resolver o problema escreveu o tratado Considerações sobre o dinheiro e o comércio, com uma proposta para suprir a nação com dinheiro. Estas idéias foram submetidas ao parlamento escocês. Law enfrentou uma oposição ferrenha, sendo inclusive acusado de plágio por Chamberlen, um inglês que faliu várias pessoas ao tentar implantar a idéia de banco imobiliário aos moldes do Holandês. Mas o que John Law estava propondo não era emitir títulos imobiliários e sim emitir títulos sem lastro, baseados apenas na confiança das pessoas no governo. O tal fiat money, em inglês.

Graças a suas ligações familiares, conseguiu se aproximar de Felipe II, então regente da França. Felipe II não tinha o intelecto dos melhores. John Law era fugitivo, mulherengo e se sustentava nas mesas de jogos, mesmo assim acabou se tornando o principal conselheiro do Felipe II, que acabou comprando as idéias revolucionárias. O tesouro público da França tinha uma dívida de 3 bilhões de livres tournous (algo como uns 3 bilhões de dólares de hoje). A promessa de Law era levantar 500 milhões sem despesas para o povo. Conseguiu autorização para fundar o primeiro banco da França: Banque Royale. Depois conseguiu permissão para emitir papel-moeda sem lastro. Este mecanismo de criar dinheiro do nada teve um efeitor multiplicador e logo os franceses passaram a se beneficiar desta circulação monetária, desta liquidez. Como não existiam ainda as salvaguardas modernas, este modelo levou à inflação. O preço dos bens subiam assustadoramente, Law tentou instituir em 500 livres o total que os indivíduos poderiam carregar no máximo (parece familiar?). Ao final das contas aconteceu a desvalorização da moeda e esta primeira experiência monetária acabou fracassando. Em breve estaremos usando esta experiência para entender melhor o Brasil. Para saber mais sobre John Law, favor verificar na Wikipedia: John Law